terça-feira, 18 de maio de 2010

Drogas? Não!



Quando se fala em drogas, pensamos saber de que se trata. Temos geralmente um conhecimento prático devido a algum caso de drogas ocorrido na própria família, na vizinhança ou com amigos.

Já conhecemos alguém viciado em cigarro que não consegue dormir direito, outro com a saúde em frangalhos por causa da bebida, alguém sem capacidade para trabalhar por causa da maconha ou vivendo na marginalidade por causa da cocaína ou do tráfico.

Além disso, muita coisa se sabe por jornais, rádio e TV. A mídia alerta contra os males e perigos das drogas, mas, ao mesmo tempo, estimula seu uso por meio de filmes, reportagens e matérias nas quais o consumo de drogas parece comportamento normal a ser imitado por quem queira identificar-se com as personalidades da moda.

Precisamos desconfiar do que já pensamos saber por experiência vivida ou pelos meios de comunicação, para então indagarmos mais seriamente sobre o tema.

A indagação pode começar de um fato cotidiano: muitas pessoas adultas, quando têm nas mãos uma garrafa de bebida alcoólica, se contentam com alguns goles. Nesse caso, mesmo sendo uma droga perigosa, o álcool não lhe faz tanto mal. Já outras pessoas, se tomam um trago não conseguem mais parar e se embebedam. Vemos que a mesma substância provoca efeitos diferentes conforme as condições da pessoa que a ingere.

O problema da droga deve, portanto, ser visto dentro do contexto sócio-cultural e das condições físicas e psíquicas que envolvem seu consumo.

O SISTEMA DAS DROGAS

No “Sistema das drogas” (relações entre produtores, intermediários e consumidores), o elemento mais visível é o usuário. Quando a pessoa atinge alto grau de comprometimento no uso da droga, pode ter sua vida praticamente arruinada. Salvo exceções, o usuário não tem acesso à droga se ela não lhe for oferecida ou vendida por alguém que age como intermediário entre a produção e o consumo.

O intermediário pode ter uma ocupação lícita (quem vende cigarro, bebida ou produtos farmacêuticos) ou ilícita (narcotraficante, farmácia que vende anfetaminas e estimulantes sem prescrição médica, ou quem vende cola de sapateiro a crianças).

A relação entre usuário e intermediário tem sido alvo mais freqüente da repressão. No caso das drogas ilícitas, essa atividade repressiva engloba desde o grande traficante que controla todo o sistema, até o “avião” que faz a entrega ao usuário.

TODOS SOMOS AFETADOS

De nosso país, até nosso bairro ou edifício, estamos conectados a esse vasto sistema das drogas. Além do “mundo das drogas”, freqüentado por marginais e pessoas desclassificadas, são muitos os fios de conexão entre o sistema das drogas e a sociedade em geral.

Essas conexões ficam mais claras quando se levam em conta todas as conseqüências diretas e indiretas do tráfico e do consumo de drogas. Quantas pessoas que nunca consumiram drogas são assaltados por gente drogada, que rouba para comprar drogas? Quantos sofrem acidente de trânsito por causa de motoristas embriagados? E a lista poderia ir longe.

O sistema das drogas causa muito mais vítimas do que parece à primeira vista.

RESPONSABILIDADE DE TODOS

Isso nos obriga a rever certas atitudes simplistas que reduzem o problema a uma questão individual, fechando os olhos para a complexidade do tema e limitando-se a propor terapias de recuperação.

Nunca é demais lembrar os estragos feitos pelo narcotráfico, sobretudo nas periferias, pensar nos gastos públicos com o tratamento de saúde dos fumantes, ou ainda no custo social do alcoolismo e tudo o que ele acarreta: acidentes de trânsito, desemprego, brigas e mortes, desmanche familiar... e há ainda o vírus HIV entre usuários de drogas injetáveis, o aumento da violência e a extensão do crime organizado a quase todas as esferas da sociedade.

Se é certo que a terapia é indispensável, importa também considerar outras ações possíveis contra o sistema das drogas, dentro do espírito de responsabilidade compartilhada.

Diante da magnitude do sistema das drogas, hoje, a necessidade de compartilhar as responsabilidades se tornou mundial, pois nenhum país é capaz de impedir sua expansão sem a colaboração de outros.

PROPORÇÕES ASTRONÔMICAS

Os dados mostram que, apesar dos esforços feitos até agora, o consumo das drogas vem atingindo formas e proporções cada vez mais preocupantes. Mas é preciso ir além dos fatos, precisamos procurar as causas e atacá-las.

O consumo abusivo de drogas não deve ser visto apenas como resultado de patologias individuais, mas como um fato social. E aqui está um grande indicativo de causa: uma sociedade como a nossa, cada vez mais pragmática, insensível, competitiva, consumista e individualista, é uma sociedade que favorece o uso de drogas.

Ela gerou um mundo onde a existência cotidiana se tornou tão árdua e tão vazia de sentido, que os tóxicos funcionam como “amortecedores” nas relações do ser humano consigo mesmo e com o mundo. Há quem use a expressão “civilização química”, para falar desta sociedade destituída de sentido verdadeiro para a vida humana.

Valores como a amizade, a solidariedade, a busca do bem comum tornam-se “caretas”, ultrapassados. A via longa, reflexiva, dialógica e comprometida é substituída pelo caminho fácil da satisfação individual. O compromisso de vida dá lugar ao evento instantâneo. O sentimento dá lugar à sensação.

A sensação de vazio e de infelicidade é o resultado dessa experiência sem profundidade afetiva, sem carinho e sem diálogo. A existência perde o tempero e o brilho, abrindo o caminho para a busca ilusória do prazer imediato. Mas este só faz aumentar a desilusão, o vazio e a infelicidade.

Daí a depressão, as despesas com infindáveis tratamentos e o recurso ao artifício das drogas, com todas as suas trágicas conseqüências. Mas não haverá droga suficiente para preencher esse poço sem fundo. Ao contrário, quanto mais drogas, mais ele se aprofunda, até à destruição total da pessoa.